quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

O Black Metal vai à Universidade

por Ben Ratliff / THE NEW YORK TIMES

O mediador Niall Scott, da Universidade de Central Lancashire, se aproximou do palco em penumbra.

– é um prazer apresentar o professor Erik Butler, que apresentará o trabalho The counter-reformation in stone and metal: spiritual substances (“A contra-reforma em pedra e metal: substâncias espirituais”, em tradução literal) – anunciou, alisando o cavanhaque.

E Butler, professor assistente de estudos alemães da Universidade de Emory, falou sobre o black metal – em sua segunda fase, na forma norueguesa principalmente – como uma expressão oculta do catolicismo romano. Ele começou com o Conselho de Trento do século 16 e a igreja moderna. Citou letras de Gorgoroth e Immortal, bandas de black metal norueguesas cujos integrantes exibiam as caras pintadas, cuja formação data do início dos anos 90. Para ele, o black metal respeita algumas das ortodoxias do rock, se opõe às heresias do disco e do punk e se preocupa com “o fixo e o transcendente: pedra, montanha, lua”.

é possível imaginar várias hostilidades em relação a Hideous Gnosis, simpósio de teoria com duração de seis horas sobre black metal que começou no sábado à tarde no Public Assembly, bar e clube noturno em Williamsburg, Brooklyn. Isso se dá não somente porque muitas pessoas gostam de ridicularizar acadêmicos que discursam sobre cultura jovem, mas porque o assunto era semelhante à música de que não se ousa falar o nome. O black metal, estilo típico dos anos 90 – com uma pré-história em algumas bandas de metal dos anos 80 – continua sendo o subgênero mais underground do metal (black se refere a uma fria percepção da vida). Musicalmente é formada por gritos, baterias poderosas não sincopadas e guitarras frias. Parece algo apodrecendo, e essa é a questão: o black metal representa a decadência, o individualismo radical, a misantropia, a negatividade em relação a todos os sistemas, e o medo do mundo natural (o death metal, por sua vez, é mais proativo, centrado no corpo e os adeptos são loucos por sangue).

– O maior artista do black metal é desconhecido e inacessível – conta Nicola Masciandaro, professor de literatura medieval da Faculdade de Brooklyn que organizou o evento de seis horas.

De certa forma, o black metal gira em torno de um motor cultural muito velho: perda de fé, e temor histérico e tristeza que a acompanham.

O estilo musical, contudo, tem sido um dos melhores modos de resistência do rock, razão pela qual persiste, e por que recentes livros e filmes sobre o tema encontraram público, como o ensaio fotográfico de Peter Beste, True norwegian black metal (“O verdadeiro black metal norueguês”, em tradução literal), e o documentário Until the light takes us (“Até que a luz nos leve”), e por que inspirou uma nova onda de bandas americanas, incluindo Nachtmystium, Krallice, Wolves in the Throne Room e Liturgy.

Mesmo que os americanos não associem tanto o black metal ao tribalismo, à violência ou à atitude antirreligiosa (alguns músicos noruegueses de black metal ganharam fama por cometer assassinato e queimar igrejas) ele continua underground.

Alguns de seus adeptos – como as bandas americanas Xasthur e Leviathan – gravam discos, mas não se apresentam ou, no caso da Leviathan, dão entrevistas. Falar sobre black metal em certas esquinas parece algo terrível.

– Há muito ressentimento em relação a um discurso sobre o black metal – disse Masciandaro em uma entrevista. – E também existem muitas divergências sobre o que, de fato, é black metal; seu centro de gravidade é uma negatividade essencial, algo que não pode ser reduzido.

Masciandaro foi inspirado a organizar o simpósio pela conferência sobre heavy metal, no ano passado em Salzburg, áustria, organizada por Scott. Ele esteve lá e quis criar um evento mais específico. Escolheu um clube com um bar como o cenário, em vez de uma universidade, achando que seria mais “lúdico”. Apesar do que músicos de black metal possam proclamar – Ovskum, cantor e guitarrista italiano, foi citado em uma das palestras do simpósio como tendo dito “minha música não vem de uma filosofia, mas de uma compulsão pré-critica” — o trabalho deles é basicamente filosofia. é teórico, uma rede para observar a vida, com raízes antigas. Poderia usar um aparato crítico, e apesar de muitas citações de filósofos como Lacan, Derrida e Bataille parecerem distantes da prática do black metal, como teorias se relacionam aos grandes temas do subgênero: morte e tempo.

(Tradução: Victor Barros)

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